FALECIMENTO DO "VDC"

Apesar deste blog ser recente, há vários anos eu frequento a blogosfera brasileira de finanças. Acompanho a página Viver de Construção quase desde a sua criação. Lá no início, na época do "boom" do mercado imobiliário brasileiro, eu me animava com a perspectiva de também investir na construção de imóveis como forma de obter uma renda extra.

O projeto há muito ficou para trás (por muitos motivos, mas principalmente por ter reconhecido que me falta conhecimento básico para entrar nesse mercado, o que implicaria em um risco muito grande), mas continuei a acompanhar o blog, até mesmo porque as postagens foram se diversificando e era notável o esmero do autor em sempre publicar atualizações e informações relevantes.

Hoje, apesar de eu ter criado um blog, sou bem menos ativo na finansfera. Com a proximidade do final do mês e de mais um fechamento, eu fui navegar nos blogs dos colegas para buscar inspirações para as minhas próprias atualizações. E algumas horas atrás eu me assustei com a notícia do repentino falecimento do autor do Viver de Construção, informado por sua esposa.

É um baque. Não consegui parar de pensar nisso nas últimas horas e, apesar de ter vindo aqui falar alguma coisa, a verdade é que ainda estou chocado. Olho para o teclado e em cada palavra digitada vai junto com um esforço enorme...

É o segundo colega da finansfera que perdemos. Em 2014 o Investidor Matuto faleceu aos 24 anos em decorrência de uma cirurgia do coração. Ele postava atualizações sobre a proximidade da cirurgia e o misto de medo e confiança que o fazia seguir em frente. Depois, mais nada até que alguém informou o falecimento na caixa de comentários do blog. A falta de postagens virou esse vazio que extrapolou as telas e veio se instalar no peito de quem, como eu, acompanhava o blog.

A blogosfera cria uma comunidade curiosa. Eu não conhecia o Matuto, não conhecia o VDC, e eles me conheciam até menos (na época de maior atividade eu comentava como anônimo ou usando contas fakes descartáveis, sempre divulguei pouquíssimas informações pessoais), mas a morte deles me abala de uma forma que eu não esperaria. Seria impossível que nós nos reconhecêssemos na rua (e quem é capaz de garantir que nunca nos esbarramos por aí?). Objetivamente, o fim das postagens daqueles dois blogs não traz nenhuma consequência na minha vida. Mas, então, por que esse aperto desgraçado no meu peito? Por que a incapacidade de pensar em outra coisa?

Ficam famílias desmembradas com uma saudade imensa, saudade do convívio passado que nunca mais será, saudade do futuro, própria das mortes precoces, de tudo o que poderia ter sido, do que esteve quase ao alcance da mão e se desvaneceu para sempre.

Vão-se as pessoas, com suas infinitas possibilidades, seus sonhos, seus medos... O destino mostra sua face cruel, que é capaz de destruir sem nenhuma dificuldade nosso mais bem engendrado plano de futuro.

Ao VDC, onde quer que esteja, deixo meus cumprimentos ao colega foi na frente rumo a essa última fronteira do desconhecido. Aos seus familiares, desejo que encontrem conforto e força para seguir em frente.

Não vou mentir que nessas horas dá vontade de lançar ao espaço cautela, números e tabelas e ir viver como se tudo estivesse por um segundo. Mas sei que não é bem assim. O controle e a frugalidade são também um exercício para a felicidade do presente, Epicuro deixou boas lições nesse sentido. É o que tem faltado a este blog, já cheio de números e tabelas, mas fica para outro momento porque este está longe de ser o mais adequado.

Agora não posso mais do que sentir a dor distante pelo passamento do homem de que sei pouco mais do que o pseudônimo. Sim, porque tudo que é humano me comove, como captou com raro brilhantismo o poeta Fernando Pessoa, sob o pseudônimo de Álvaro de Campos, em um poema que sempre me vem à lembrança sempre que me vejo abalado por notícias de alguém tão distante:
Saí do comboio,
Disse adeus ao companheiro de viagem
Tínhamos estado dezoito horas juntos..
A conversa agradável
A fraternidade da viagem.
Tive pena de sair do comboio, de o deixar.
Amigo casual cujo nome nunca soube.
Meus olhos, senti-os, marejaram-se de lágrimas...
Toda despedida é uma morte...
Sim toda despedida é uma morte.
Nós no comboio a que chamamos a vida
Somos todos casuais uns para os outros,
E temos todos pena quando por fim desembarcamos.
Tudo que é humano me comove porque sou homem.
Tudo me comove porque tenho,
Não uma semelhança com ideias ou doutrinas,
Mas a vasta fraternidade com a humanidade verdadeira.
A criada que saiu com pena
A chorar de saudade
Da casa onde a não tratavam muito bem...
Tudo isso é no meu coração a morte e a tristeza do mundo.
Tudo isso vive, porque morre, dentro do meu coração.
E o meu coração é um pouco maior que o universo inteiro.


Comentários

  1. Uma composição em homenagem ao VDC: https://www.youtube.com/watch?v=e1_lO5jjHo0&feature=youtu.be

    O mínimo que posso fazer.

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